Uma “máscara” feia*

Algumas pessoas usam máscaras. Mas não é fácil reconhecer. Esta é a história de uma jovem num ônibus, cheia de sonhos e esperanças para o futuro. Um momento depois, ela vê-se numa espiral de violência e dor, com poucas esperanças de sobreviver. Enganada por uma senhora cujo rosto bondoso mascara as suas intenções cruéis, leva-a para longe de todos, para um inferno que parece não ter fim. 

Esta é a história de Favor e, infelizmente, de muitas outras moças em todo o mundo. Rezamos para a sua voz ser ouvida e para que a prevenção e a ação sigam por todos os cantos, para que ninguém volte a cair neste horrível poço do tráfico de seres humanos.

De volta à minha família, ao meu país, à minha vida

O meu nome é Favor e tenho 16 anos.

A minha história começa com uma viagem de ônibus. Eu esperava encontrar trabalho na cidade como empregada doméstica de uma família, pensando em como mudar o meu futuro para melhor, imaginando ir à escola com o dinheiro que em breve eu ganharia.

No ônibus, sentou-se ao meu lado uma senhora que aparentava uns 40 anos, de aspecto simpático, e começamos a conversar. Ela fez-me muitas perguntas, querendo saber para onde eu ia, se viajava sozinha e se já tinha estado em Lagos. Respondi educadamente a todas as suas perguntas; a conversa foi agradável e foi bom sentir que alguém estava interessado em mim.

Ela ficou curiosa quando lhe disse que ia aceitar um emprego numa família como empregada doméstica para poder pagar a escola e perguntou-me quanto me pagariam. Quando lhe disse, ela olhou para mim e disse-me que, com a pequena quantia que iria ganhar, nunca poderia ir à escola, mesmo que poupasse durante os próximos 5 anos. Se receber uma educação era o meu verdadeiro sonho, então devia segui-la para o Gana, para que ela pudesse me ajudar a encontrar um bom emprego que me permitisse pagar os meus estudos.

Ela pareceu-me tão convincente e generosa que aceitei a sua oferta; parecia ser a única forma de realizar o meu sonho. Mas quando cheguei a Kumasi, tudo mudou instantaneamente. Nem sei como explicar. A sua bondade transformou-se em violência. Todo o meu mundo se desmoronou quando chegamos a um hotel e ela me disse que aquela era a minha nova casa. Depois obrigou-me a prostituir-me.

Vivi com a minha traficante no mesmo quarto de hotel durante dois meses horríveis. Todos os dias, ela arranjava inúmeros homens para dormirem comigo; eles pagavam-lhe diretamente. Alguns recusavam-se a dormir comigo dizendo que eu era muito nova. Enquanto eu estava no quarto com um homem, a minha traficante ficava do lado de fora; e, às vezes, a minha traficante dormia com homens da sua escolha, mandando-me para fora do quarto de hotel.

Numa dessas ocasiões, durante uma noite fria e chuvosa, estive horas à espera lá fora. Estava tanto frio que rezei pela morte. Passado algum tempo, uma funcionária do hotel aproximou-se de mim. Falou com uma voz muito firme e um olhar assustador, o que me deixou ainda mais assustada: “Menina, em nome de Deus, o que você está fazendo aqui? Se você não está no seu quarto de hotel com um homem, você fica do lado de fora à espera que a sua traficante tenha a sua vez”. Ela continuou: “Agora, diga a verdade, quem é esta mulher para você?” Eu menti-lhe e disse que a minha traficante era a minha irmã mais velha. A mulher gritou mais alto: “Menina, diga-me a verdade, esta mulher não pode ser sua irmã se te trata assim”.

Desmoronei e contei-lhe tudo. Ela abraçou-me e perguntou-me se eu queria ser liberta. Eu não queria mais nada, mas não conhecia ninguém em Kumasi ou no Gana. Nesse momento, a mulher levou-me à polícia. A polícia seguiu-nos até ao quarto de hotel e prendeu a minha traficante. 

Depois disso, fui levada para a Safe-Child Advocacy (Centro de Defesa e Segurança da Criança) das Filhas da Caridade em Kumasi. As Irmãs e o pessoal acolheram-me e tranquilizaram-me; levaram-me para o seu centro de formação profissional e deram-me abrigo, cuidados e proteção.

Fiquei muito chocada e confusa quando cheguei lá e continuo tentando reconstruir a minha vida. As Irmãs e a Organização Internacional para as Migrações (OIM) ajudaram-me a regressar à Nigéria. Estou agora com a minha família, tentando recuperar dos horrores destes meses. 

Eu ainda gostaria de ir à escola e a minha família está esforçando para conseguir dinheiro para isso. Concluí o ensino médio e quero ir para faculdade tornar enfermeira. Se isso não for possível, quero aprender a profissão de cabeleireira e abrir meu próprio salão. 

*Os detalhes desta história foram modificados para proteger a identidade da beneficiária. Foram feitas alterações no nome e na fotografia dela. Todas as outras informações são exatas, tal como narradas por ela.